Seja para habitação ou outros fins, a lei prevê diferentes direitos de proteção no que diz respeito ao arrendamento tanto para o inquilino como para o senhorio. Perante o incumprimento do contratualizado por ambas as partes, uma das possibilidades de resolução é o despejo. Neste artigo, explicamos a arrendatários e senhorios quais as regras relacionadas com este procedimento.
O que é um procedimento especial de despejo?
Despejar um inquilino de um imóvel arrendado é apenas possível através de um processo legal. Assim, o procedimento especial de despejo define-se como o meio processual que aciona a cessação do arrendamento e é utilizado perante a recusa em desocupar o local arrendado na data prevista na lei ou na data fixada no contrato entre as partes. O mecanismo integra o Novo Regime do Arrendamento Urbano, alterado em 2023. Ao mesmo tempo, a legislação define quais os motivos que podem conduzir a este procedimento:
- Cessação do contrato por acordo (revogação);
- Oposição à renovação, pela parte do senhorio ou do arrendatário;
- Caducidade pelo decurso do prazo fixado no contrato;
- Denúncia do contrato pelo senhorio ou pelo arrendatário;
- Resolução com fundamento em mora do pagamento de rendas;
- Resolução com fundamento na oposição do arrendatário à realização de obras.
Tome nota
O procedimento especial de despejo é acionado pelo antigo Balcão Nacional do Arrendamento (BNA), agora denominado de Balcão do Arrendatário e do Senhorio (BAS), um organismo dependente da Direção Geral da Administração da Justiça. No entanto, para que se possa avançar com este procedimento, devem cumprir-se duas condições fundamentais: a existência de um contrato de arrendamento escrito e o comprovativo de pagamento do respetivo Imposto do Selo.
Como exigir um despejo?
Para dar início a este procedimento judicial, o senhorio deve apresentar um requerimento de despejo. Poderá fazê-lo das seguintes formas:
- No site do BNA, enviando a documentação pedida e assinando eletronicamente, sendo que, para isso, é necessário ter um leitor do cartão do cidadão. Se não o tiver, pode preencher o formulário em PDF, diretamente na plataforma do BNA, e aguardar pela referência enviada pelo sistema. Num prazo de dez dias, deve apresentar a mesma em conjunto com a documentação solicitada numa secretaria judicial;
- Recorrendo a um advogado ou solicitador, que possa preencher e enviar o formulário através do sistema informático CITIUS;
- Dirigir-se a uma secretaria judicial e entregar toda a documentação exigida, bem como o requerimento preenchido em papel.
Assim que é apresentado o requerimento de despejo, a Justiça é chamada a pronunciar-se sobre os argumentos apresentados, independentemente de o inquilino se opor.
Se o inquilino não se opuser ao despejo
Na ausência de uma oposição formal por parte do inquilino, não sendo pagas as eventuais rendas em falta e dando o tribunal razão ao senhorio, é proferida uma decisão judicial que permite o despejo imediato.
Se for apresentada uma oposição
Existindo oposição ao despejo, os prazos são diferentes. Em primeiro lugar, o inquilino tem 15 dias para apresentar a sua oposição. Em seguida, o senhorio é notificado e tem dez dias para recorrer a tribunal, devendo aguardar até 20 dias (a contar da distribuição dos autos) pela audiência de julgamento. Se o tribunal der razão ao senhorio, o inquilino é obrigado a desocupar o imóvel no prazo de 30 dias. Depois disso, tem 15 dias, após a tomada da posse do imóvel por parte do senhorio, para remover todos os seus bens móveis. Findo o prazo, estes são considerados abandonados.
Quanto custa acionar um procedimento de despejo?
Em primeiro lugar, é necessário calcular o valor do procedimento especial de despejo, que corresponde à soma de dois anos e meio de renda acrescida do montante das rendas em dívida. Se o resultado for igual ou inferior a 30 mil euros, o senhorio deve pagar uma taxa de justiça de 25,50 euros. Caso o valor do procedimento supere os 30 mil euros, a taxa sobe para 51 euros. Ainda assim, em alguns casos, o senhorio pode beneficiar de apoio judiciário através da Segurança Social.
Quantas rendas em dívida podem motivar uma ação de despejo?
Segundo o Código Civil, o senhorio pode denunciar o contrato ao fim de uma mora igual ou superior a dois meses no pagamento da renda. Também pode fazê-lo se constatar um atraso superior a oito dias, por mais de quatro vezes, seguidas ou interpoladas, num período de 12 meses. No entanto, para avançar com uma ação de despejo, é necessário existirem três rendas em atraso.
Estado paga rendas em atraso aos senhorios
Para impedir que, perante um atraso de três meses no pagamento de rendas, os senhorios se vejam privados dessa quantia monetária, o Estado pode assegurar o pagamento dessas mesmas rendas. A medida integra o pacote “Mais Habitação” e é colocada em prática sempre que o inquilino tenha uma carência financeira comprovada. Caso tal não se verifique, o Estado pode avançar para a cobrança dos valores em falta ou para o despejo do inquilino.
O inquilino pode regularizar a dívida e evitar o despejo?
Se já tiverem passado três meses sobre o não pagamento das devidas rendas e o senhorio tenha avançado para o procedimento de despejo, o inquilino apenas poderá apresentar a sua oposição ao processo. No entanto, para evitar que o senhorio rescinda o contrato por mora no pagamento das rendas, o inquilino tem estas possibilidades:
- Pagar o valor em dívida nos oito dias seguintes à data do incumprimento;
- Passados estes oito dias e até ao final do terceiro mês de renda (ou seja, tendo já duas rendas em dívida), pagar as rendas em atraso e uma indemnização de 50% do valor devido.
Como pode o inquilino apresentar uma oposição ao despejo?
Como referido, o inquilino tem 15 dias para se opor ao procedimento de despejo, uma ação que apenas pode ser realizada por um advogado ou solicitador e que implica o pagamento de uma taxa de justiça de 306 euros (se procedimento de despejo for de valor igual ou inferior a 30 mil euros) ou de 612 euros (se for superior a 30 mil euros). Se existirem rendas por pagar, a oposição só tem validade mediante a apresentação conjunta do comprovativo de pagamento de uma caução até ao valor de seis rendas (salvo se o inquilino beneficiar de apoio judiciário).
Caso não tenha meios para contratar um profissional, pode recorrer ao apoio judiciário através da Segurança Social.
Pessoas vulneráveis têm algum mecanismo de proteção?
A lei prevê, ainda, uma forma alternativa de evitar o despejo, apenas nos casos em que o imóvel é a primeira habitação de pessoas em situações de vulnerabilidade social, económica ou de saúde. Neste contexto, um grau de incapacidade superior a 60% ou o facto de o inquilino ser beneficiário do rendimento social de inserção ou de subsídio de desemprego de valor igual ou inferior ao salário mínimo nacional (de 760 euros, em 2023) serão motivos para travar o despejo.
Ainda assim, o inquilino tem de requerer ao tribunal da área do imóvel em causa, no prazo de 15 dias a seguir à notificação do despejo, “o diferimento da desocupação por razões sociais imperiosas”, devidamente comprovadas. Será, ainda, necessária a comparência de até três testemunhas em tribunal.
Já quanto a pessoas idosas ou com deficiência que sejam arrendatárias do mesmo local há 15 anos, a lei prevê que o juiz competente suspenda o despejo nos casos de denúncia do contrato por motivos de demolição ou realização de obras, de comunicação da cessação do contrato com uma antecedência mínima de cinco anos ou na sequência da oposição do senhorio à renovação do contrato.