Janeiro 16, 2025

O setor social terá um futuro risonho?

A conferência “O papel e o futuro do setor social”, que contou com a presença da ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Maria do Rosário Palma Ramalho, destacou o papel fundamental do mutualismo na construção de uma sociedade mais justa, saudável e feliz.

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O Estado tem muito a aprender com as associações mutualistas, que estão mais próximas das comunidades e respondem melhor às suas necessidades. Esta foi uma das principais ideias identificadas pela ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Maria do Rosário Palma Ramalho, na conferência “O papel e o futuro do setor social”, organizada pelo jornal Expresso e que contou com o apoio do Montepio Associação Mutualista.

“O Estado não está em concorrência com o setor mutualista. É um grande parceiro e não um concorrente. As associações mutualistas têm uma forma inventiva de resolver os problemas”, realçou a ministra. Maria do Rosário Palma Ramalho assegurou ainda um “aumento da capacidade financeira” para apoiar o setor social, reconhecendo uma preocupação especial em formar dirigentes e trabalhadores para esta parte importante da economia portuguesa.

Entrevistada pela moderadora Nelma Serpa Pinto já na parte final da conferência, Maria do Rosário Palma Ramalho garantiu ainda a articulação entre os ministérios da Segurança Social e da Saúde, um dos apelos que os vários oradores foram deixando ao longo da tarde.

“Temos uma esperança média de vida grande, mas é imperativo que as pessoas vivam com mais qualidade. Os lares são muito importantes e têm de ser acarinhados, através do apoio às instituições. Mas é necessário encontrar outras soluções que permitam às pessoas manterem-se em casa mais tempo”, esclareceu. Além da reformulação do estatuto do cuidador informal, que chega hoje a mais pessoas, os dois ministérios estão a trabalhar em programas de apoio domiciliário que visam garantir qualidade de vida na idade mais avançada, permitindo manter as pessoas em casa o maior tempo possível.

Uma conferência que uniu o setor social

Com oito oradores de diversas franjas da sociedade e dezenas de líderes do terceiro setor na plateia, a conferência reafirmou o protagonismo do estado social na vida das pessoas. “O estado social foi um avanço civilizacional extraordinário, mas está confrontado com ameaças à sua sustentabilidade. É difícil dar tudo a todos”, disse Virgílio Boavista Lima, presidente do Montepio Associação Mutualista, no discurso de abertura.

De acordo com o gestor, as mutualidades, misericórdias, cooperativas, fundações e associações com fins altruístas constituem uma parte muito relevante da economia social, abrangendo temas tão importantes como o da segurança social, da saúde, da habitação e da longevidade.

“É um setor exposto a alguns riscos: a sua própria sustentabilidade, o profissionalismo na sua gestão, os mecanismos de regulação e controlo interno, os impactos da longevidade e as transições tecnológicas, entre outras”, assegurou o presidente do Montepio Associação Mutualista. 

No primeiro painel, que teve como tema “O papel do setor social nas comunidades”, Manuel Lemos destacou o aumento da longevidade como um dos grandes desafios do futuro do setor social. “Temos de encontrar formas de ajudar as pessoas a envelhecer felizes”, frisou o presidente da União das Misericórdias Portuguesas. Antes, já o ex-ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, Pedro Mota Soares, tinha enaltecido o setor social pelo trabalho nas creches, lares e instituições de apoio aos deficientes, garantindo que ferramentas como a Inteligência Artificial (IA) podem ajudar o setor social a colmatar mais necessidades.

Ainda neste painel, o investigador António Brito Guterres considerou o setor social o espaço “mais plural da sociedade”, elogiando a proximidade do terreno e o modo como “ensina” o Estado a fazer políticas públicas.

Saúde e setor social são almas gémeas?

Com a segunda população mais envelhecida da Europa, Portugal enfrenta desafios urgentes nas respostas de saúde. “Não podemos depender dos outros. O mutualismo pode ter respostas de saúde que garantam uma cultura de responsabilidade. E não podemos esquecer a prevenção”, explicou Maria de Belém Roseira, ex-ministra da Saúde e oradora do segundo painel, que teve como tema “O papel do terceiro setor na proteção social e longevidade”.

João Duque, professor catedrático do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), colocou o dedo na ferida quando disse que existe falta de capacidade de gestão no setor social. “Não remunera bem e não tem quadros qualificados”. Segundo o professor, este setor anda “ao sabor do vento do que o Estado decide por ele”, sendo imperativo a existência de uma “sociedade civil forte para financiamento, do mutualismo aos mecenas”. “Há muitas entidades a investir na qualificação das entidades do setor social”, contrapôs Maria de Belém Roseira. “E o Montepio é uma delas”.

No mesmo painel, Nuno Marques, cardiologista e ex-coordenador do Plano de Envelhecimento Ativo e Saudável, realçou a importância das políticas de continuidade e a integração das várias intervenções sociais. “Temos de ter uma entidade única a organizar cuidados de longa duração: segurança social e saúde. Não é preciso uma grande reforma, mas evoluir o que temos. Caso contrário, temos uma quebra dos cuidados prestados às pessoas.”

O futuro do mutualismo está no passado?

No último painel do dia, o mutualista Vítor Melícias e o investigador José Eduardo Franco explicaram como a história pode ajudar a encontrar caminhos para o futuro do mutualismo. “Para o mutualismo ter futuro precisa de viver o presente com paixão. O mutualismo dá primazia à pessoa e acreditamos que o mundo pode ser diferente”, explicou o padre Melícias.

Em 1930, existiam 533 mutualistas. Destas, só o Montepio Associação Mutualista vingou. “O Montepio está constantemente a reinventar-se”, explicou José Eduardo Franco, investigador e coordenador da Universidade Aberta. Estará aqui, também, a chave do futuro. “Mutualismo é utopia social, interclassismo e uma sociedade mais feliz.” Numa sociedade aberta como a atual, cabe às associações mutualistas tornar o mutualismo mais relevante para as gerações mais jovens. “Temos desafios únicos e todos somos poucos. Temos de saber comunicar as vantagens do mutualismo, mas também envolver os mais jovens nas decisões”, concluiu.