Poupança de Associado, alma de artista

Poupança de Associado, alma de artista
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Fotografia de Rodrigo Cabrita
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eparadas por quase sete décadas de vida, Alexandra Sousa, de 26 anos, e Dulce Roselló, de 97, são dois exemplos de como a criatividade pode transformar vidas, mesmo quando a sociedade não o espera.

Alexandra Sousa é um exemplo de resiliência e determinação. Licenciada em Ciências da Comunicação e a concluir um mestrado em Educação, a sua trajetória é de superação. Em criança, ficou órfã de pai e mãe. E com um diagnóstico de paralisia cerebral, as probabilidades estavam contra ela. Porém, o apoio incondicional que recebeu da sua avó, que se tornou a sua tutora legal, foi transformador.

Desde cedo, a avó incutiu-lhe a importância da educação e da autonomia. “Lembro-me de a minha avó me dizer, muitas vezes: ‘A única forma de fazeres frente à tua dependência física é teres independência intelectual e financeira’.” A jovem recorda que, desde criança, a avó a levava-a a um balcão Montepio para que pudesse aprofundar os conhecimentos financeiros. “Na altura, achava uma seca. Mas hoje percebo perfeitamente”, afirma, acrescentando que ainda conhece todos os funcionários pelo nome. Tinha 6 anos quando a avó a tornou Associada Montepio. “A minha avó sabia que, dada a sua idade, não poderia acompanhar-me o tempo que os pais acompanham os filhos. Por isso, procurou a Associação numa ótica de proteção para o futuro. Queria que eu, na sua ausência, tivesse uma almofada financeira para poder estar tranquila”, prossegue a jovem do Porto.

“Lembro-me de a minha avó me dizer, muitas vezes: ‘A única forma de fazeres frente à tua dependência física é teres independência intelectual e financeira’”

Alexandra Sousa, Associada Montepio e artista

Dois lados da mesma moeda

Todos temos um lado racional, responsável pela lógica, e outro criativo, o da emoção. No Montepio Associação Mutualista (MAM), esta dualidade é reconhecida e celebrada. Os associados exploram o lado racional através da subscrição de modalidades mutualistas ou ao aproveitarem os benefícios financeiros e não-financeiros de ser Associado. Mas também podem dar asas à sua vertente criativa através dos vários projetos que incentivam a expressão artística e a troca de ideias que têm lugar nos espaços Atmosfera m de Lisboa e do Porto.

Apesar dos desafios da vida, Alexandra nunca deixou de cultivar o seu lado criativo. “Sempre gostei muito de escrever”, diz, revelando que a escrita foi uma maneira de dar voz à forte imaginação que, desde muito jovem, faz parte de si. Com apenas 10 anos começou a criar histórias, e foi aí que surgiu a ideia para o seu primeiro livro: As Traquinices da Tucha, uma obra infantojuvenil que aborda temas como ecologia e inclusão através das aventuras de uma menina e da sua cadela.

O livro reflete diretamente a sua experiência de vida. “Eu nunca senti bullying por parte dos meus colegas. O problema era o próprio sistema escolar, que não estava, nem está, preparado para a inclusão.” Para Alexandra, é urgente uma mudança no sistema educativo. “Consegui contornar essas limitações, mas sei que centenas de crianças com capacidades semelhantes às minhas são canalizadas para currículos específicos e escolas segregadas, quando poderiam perfeitamente concluir uma licenciatura como eu”, afirma.

Durante anos, o rascunho ficou a ganhar pó numa gaveta. Até que um dia, já a sua avó estava doente, mostrou-o a uma amiga. “Ou lanças agora, ou nunca mais”, disse-lhe a amiga. Movida pelo desejo de concluir o projeto antes que fosse tarde demais, Alexandra enviou o manuscrito a várias editoras. “Não estava preocupada com comissões, vendas ou lucro. Queria que o livro saísse cá para fora o mais cedo possível”, relembra. A publicação aconteceu a 1 de agosto de 2022, três dias após o falecimento da avó. “Foi um momento muito difícil para mim, mas não fiquei presa a esse acontecimento.” Neste momento, Alexandra encontrou na Associação um apoio. “O lançamento realizou-se no espaço Atmosfera m, no Porto, onde recebi todo o apoio de que necessitava”, explica.

Cátia e a sua consciência

O livro As Traquinices da Tucha conta a história de Cátia, uma menina de 10 anos, filha única, que vive com os pais. “É uma menina perspicaz, curiosa e ativista.” Um dia, a menina encontra uma cadela no caixote do lixo. Ao longo da narrativa, o animal torna-se a consciência de Cátia, alertando-a para questões como a ecologia e a aceitação da diferença. Através dessa relação, Alexandra procura despertar nos leitores mais jovens uma consciência social e ambiental desde a infância. “Acredito que é desde pequenas que se podem consciencializar as crianças. Se houver uma política educativa ligada à inclusão e à empatia, estamos a construir uma sociedade mais consciente”, defende.

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A arte não tem idade

Quando se reformou, aos 83 anos, Dulce Roselló idealizou que passaria os seus dias a ler e a ouvir música. Porém, rapidamente percebeu que se não encontrasse uma atividade que a ocupasse não ficaria “boa da cabeça”, conforme descreve. Foi então que, numa viagem a Barcelona, descobriu a arte têxtil, expressão artística que a cativou pelas suas inúmeras possibilidades. “Vi uma exposição de obras têxteis e pensei: isto é para mim, porque requer muito trabalho e dedicação. Não é só criar uma ideia, é concretizá-la em algo tangível.”

Inicialmente autodidata, Dulce procurou aprender mais e começou a frequentar cursos e workshops com mestres internacionais para aprofundar a sua técnica. Foi o patchwork — a junção de retalhos com formas geométricas — que lhe chamou a sua atenção. “A arte têxtil está aberta à pintura, a vários tipos de trabalho de bordado — à mão ou à máquina — e a materiais que não são os usuais no patchwork, como a seda.” 

Quando já tinha um conjunto de obras terminadas, Dulce Rosseló começou a procurar uma galeria para expor os seus trabalhos. “Não granjeei grande interesse, porque as galerias só consideram artista aquele que pinta ou faz escultura. Em Portugal, quem faz o meu tipo de trabalho não é reconhecido”, desabafa. Porém, quando bateu à porta do Atmosfera m Lisboa, a sorte mudou. “Fui muito bem recebida, adoraram os meus trabalhos e perceberam que tinha potencial para uma exposição”, revela a Associada Montepio.

Para a artista têxtil, a arte tem um papel muito importante: “Deixa-me ocupada muitas horas por dia a fazer algo de que gosto muito.” A inspiração e as ideias surgem naturalmente. “Geralmente, não faço um esboço. Quando começo sou logo influenciada pelos materiais que tenho — pelos tecidos, pelas linhas —, e é aí que as ideias aparecem.” Segundo a própria, a idade não é um impedimento para a criação. “A criatividade está sempre pronta a manifestar-se”, exclama. Mas, muitas vezes, o desejo de criar esbarra nas limitações da idade. “Já Picasso dizia: ‘Por vezes queremos, mas já não temos forças.’ Mas a minha fraca mobilidade nunca me impediu de viajar, assistir a exposições ou criar”, remata.

Olhar para o futuro

Aos 97 anos, Dulce ainda se maravilhava com o que a arte tem para lhe oferecer. “O meu lema agora é envelhecer aprendendo. Aprender coisas que não sei fazer. Em 2023, fiz um ano sabático, em que só estive a estudar. Faço workshops com uma entidade artística do Canadá, por Zoom. Entretanto, também comecei a ter aulas de informática uma vez por semana”, afirma a artista.

Neste momento, a Associada está a preparar-se para fazer novos trabalhos com materiais “que não há cá, nem no resto da Europa,” e a aprender uma nova técnica de “trabalhar com sedas e impressão a partir de botânica”, explica.

Mais a norte, Alexandra Sousa continua a sonhar. O próximo grande objetivo é encontrar trabalho na área dos seus estudos, que lhe permita colocar em prática os conhecimentos adquiridos. “Neste momento sinto-me um bocadinho desaproveitada pelo próprio sistema. Tenho capacidades que não estou a pôr em prática”, explica. Porém, se não conseguir, pensa em criar o seu próprio trabalho. “Quando não encaixamos em nenhum lugar temos de criar o nosso próprio lugar”, remata.

E qual será o próximo livro? “Será um livro de testemunhos de pessoas que entrevistei ao longo do meu percurso académico. Mas quero acrescentar algumas pessoas de quem gosto e que podem ter algo para contar”, remata.

Na arte têxtil ou na literatura, as duas associadas sabem que podem contar com o apoio do Montepio Associação Mutualista para transformar as suas paixões em realidade e, de uma forma criativa, deixar a sua marca no mundo.

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