O custo de vida vai aumentar. Está preparado?

O custo de vida vai aumentar. Está preparado?
15 minutos de leitura
Ilustração de Tiago Galo
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inflação disparou no ano passado e o cenário vai manter-se em 2022. Todos sentiremos os seus efeitos: energia, alimentos, matérias-primas, automóveis, brinquedos ou gadgets mais caros. Saiba por que a inflação é tão importante para o custo de vida e como contornar esta taxa silenciosa através de dicas que ajudarão a poupar noutras áreas.

Um dos indicadores económicos mais esquecidos saltou para o topo das preocupações na economia mundial, em 2021. A inflação disparou um pouco por todo o mundo e promete continuar, este ano, em níveis muito elevados. Bancos centrais, investidores e governos foram os que começaram por sofrer as maiores dores de cabeça, mas a inflação elevada deve ser uma preocupação para todos, das famílias às empresas.

Depois de muitos anos com valores contidos (e até negativos), passando quase sempre despercebida a muitos de nós, a inflação acelerou de forma rápida para valores não vistos há muito tempo. O problema é mesmo esse. Uma subida abrupta e prolongada é um fator de pressão na economia, empresas e orçamentos das famílias. Se os produtos ficam mais caros e os rendimentos (salários) não aumentam, as famílias perdem poder de compra. Daí que a inflação seja classificada, por muitos, como uma espécie de imposto escondido, sobretudo quando está em níveis elevados.

A importância da inflação vai muito além de um mero indicador para medir a evolução dos preços. É o referencial para as negociações de aumentos de salários, para fixar o valor das pensões e para os bancos centrais definirem o nível das taxas de juro. É também a partir da inflação que são definidos os preços de bens e serviços, como são exemplo as portagens.

Os leitores mais antigos certamente recordarão quando, na década de 1980, a inflação em Portugal se fixou nos 20%. Nessa altura era uma preocupação permanente do dia a dia, com os preços dos bens a aumentarem continuamente. Estamos muito longe desse nível de há quarenta anos. A inflação em Portugal atingiu 3,3% em janeiro, o nível mais elevado desde 2012. Os preços dos produtos energéticos dispararam 12%, face a janeiro de 2021, e os alimentos ficaram 3,4% mais caros. Ainda assim, a subida de preços em Portugal é bem mais ténue do que a registada noutros países (é a segunda mais baixa entre todos os países que partilham o euro). Na Zona Euro a inflação atingiu 5,1% em janeiro, o registo mais elevado de sempre. Nos Estados Unidos já está em 7%, um máximo em quarenta anos.

Em janeiro, a inflação em Portugal atingiu os 3,3%, o nível mais alto desde 2012. Mas a tendência é global

Por que razão a inflação faz aumentar os preços dos produtos?

Quando a inflação começou a acelerar no ano passado, os responsáveis dos bancos centrais e os políticos começaram por desvalorizar a tendência, classificando a evolução como “temporária” ou “transitória”. O principal argumento passava por a inflação estar a ser impulsionada sobretudo pelos preços da energia (petróleo, eletricidade e gás natural), que iriam abrandar. Mas a verdade é que já estamos no início de 2022 e a inflação não dá sinais de alívio, mostrando que o agravamento do indicador vai muito além da energia e pode ser mais estrutural do que se previa.

Além da energia, a inflação está a ser pressionada por dois outros fatores. Com grande parte da população mundial a receber a vacina contra a COVID-19, o consumo das famílias, que foi muito reprimido durante os confinamentos, aumentou em flecha. O aumento da procura coincidiu com o agravamento nos problemas das cadeias de abastecimento. A escassez de bens para produção, o aumento dos custos de transporte e a escalada dos preços da energia penalizaram a atividade das fábricas um pouco por todo o mundo. Estas não conseguiram responder ao aumento da procura, o que explica a ausência de muitos bens nas prateleiras dos supermercados e outras lojas. Explica, também, a subida de preços de muitas empresas, que passaram para os clientes o agravamento dos custos de produção.

Com os problemas nas cadeias logísticas sem fim à vista nos próximos meses, o mais certo é que a inflação elevada esteja para ficar. Se nada pode fazer para contrariar este fenómeno, certo é que tem ferramentas ao seu dispor para controlar o orçamento familiar. Mas antes é importante que saiba o que é e como se calcula este indicador, cujo efeito se compara a um imposto e tem forte impacto no custo de vida.

Como se calcula a inflação?

A inflação é uma percentagem que corresponde à variação do índice de preços no consumidor (IPC). Este índice é composto por um cabaz de bens e serviços que tenta replicar os gastos médios do consumidor, ponderando os vários produtos e serviços na medição da inflação. É com base na variação dos preços dos produtos (sejam artigos que consumimos todos os dias ou bens duradouros) e dos serviços que entidades como o Instituto Nacional de Estatística (INE) calculam o IPC todos os meses.

A comparação do IPC entre determinado mês e o mesmo mês do ano anterior é o indicador eleito para a medir a inflação. É a denominada inflação homóloga, que, em janeiro de 2022, atingiu 3,3% em Portugal. A variação de um mês face ao mês anterior (inflação mensal) é sobretudo relevante para avaliar a rapidez com que os preços estão a acelerar (ou a abrandar). Em janeiro atingiu 0,3%. Há ainda a inflação média dos últimos doze meses, que é menos volátil e mostra de forma mais fidedigna a evolução dos preços da economia a médio e longo prazo. Corresponde à variação do IPC num período de doze meses face ao valor dos doze meses anteriores. Em janeiro atingiu 1,5%. Os economistas também dão relevância a outros indicadores que expurgam do cabaz geral vários bens com preços mais voláteis. É o caso da inflação core (ou subjacente), que não tem em conta a variação dos preços dos alimentos e da energia, bens que são sujeitos a variações de preços mais bruscas. Em janeiro atingiu 2,5%.

Como é evidente, cada família tem os seus hábitos de consumo, que não correspondem exatamente ao cabaz definido pelas entidades que medem a inflação. Se possui automóvel, tem três filhos e vai habitualmente ao cinema ou a espetáculos, a sua inflação será diferente de quem se desloca sempre de transportes públicos, faz as suas refeições em restaurantes e vive sozinho. Para saber qual é a sua inflação, experimente esta ferramenta do Banco Central Europeu que calcula a inflação depois de inserir quanto gasta em bens e serviços.

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Por que razão a inflação é elevada?

Se a inflação elevada é preocupante, o seu inverso pode ainda ser mais perigoso. A descida dos preços de forma contínua (deflação) pode mesmo provocar uma recessão. Quando os preços estão a cair, as famílias adiam as decisões de comprar produtos e serviços, esperando que no dia seguinte estejam mais baratos. Este comportamento pode provocar uma estagnação na economia, quebrando de um modo acentuado a atividade das empresas e as receitas fiscais dos países, o que conduzirá a uma recessão que poderá ser difícil de ultrapassar. Por essa razão, o Banco Central Europeu agiu com determinação, em 2016, para estimular a inflação na Zona Euro, quando a deflação era uma séria ameaça devido à descida dos preços ao longo de meses seguidos.

Então, qual o nível de inflação ideal? Depende sobretudo de cada economia. Na Zona Euro, o BCE tem como principal missão manter os preços estáveis, pois esse é o “melhor contributo que os bancos centrais podem dar para melhorar o bem estar das pessoas”. A autoridade monetária da Zona Euro realça que os “preços estáveis asseguram o crescimento da economia e a segurança do emprego”, para que cada europeu possa “confiar que o dinheiro na sua carteira terá amanhã, mais ou menos, o mesmo valor que hoje”. No âmbito do mandato para a estabilidade de preços, o BCE tem como meta manter a taxa de inflação homóloga na Zona Euro em redor de 2% no médio prazo. Apesar do indicador estar atualmente a um nível que mais do que duplica a meta, o BCE mantém a visão de que a alta dos preços vai abrandar, perspetivando o regresso da inflação para os 2%, em 2023.

Esta postura do BCE representa um duplo golpe para os aforradores, que veem, por um lado, o seu custo de vida aumentar devido à subida dos preços e, por outro, as poupanças a desvalorizarem em termos reais se não estiverem aplicadas (ou paradas numa conta à ordem no banco). Como o Banco Central não pretende aumentar as taxas de juro este ano, os produtos financeiros de baixo risco vão continuar a gerar rendibilidades muito baixas que não deverão compensar a subida dos preços. Além da alta da inflação reforçar a necessidade de poupar, também torna urgente que encontre a melhor solução para colocar as suas poupanças a render. As instituições financeiras disponibilizam diversas aplicações de baixo risco que permitem compensar a subida da inflação.

Ao longo do ano, os consumidores podem esperar um aumento generalizado nos preços em todos os setores

Divida as despesas para conseguir controlá-las

Independentemente do nível da inflação, criar hábitos de poupança deve ser uma prática recorrente. Esta deve ser reforçada em momentos em que o custo de vida aumenta, como o que vivemos atualmente. São muitas as dicas que pode seguir (mais à frente neste artigo listamos várias) mas, antes de mais, é preciso planeamento.

Se não tem esta prática, é fundamental que comece por fazer um orçamento familiar para saber quanto gasta em despesas essenciais e fixas (alimentação, habitação, educação, água, luz, gás, transportes, etc.) e variáveis (roupa, restaurantes, viagens, entretenimento, etc.). Avalie os rendimentos e calcule quanto consegue colocar de parte todos os meses. Com este exercício, será mais fácil delimitar as despesas fixas, separando-as das que não são essenciais. E também identificar onde será mais fácil cortar sem alterar substancialmente o seu modo de vida e os hábitos de consumo.

Feitas as contas, defina um objetivo de poupança. Dizem os especialistas que o ideal é conseguir guardar 20% dos rendimentos todos os meses. Esse montante permitirá criar um fundo de emergência ou apenas concretizar um objetivo como a aquisição de um automóvel, de uma viagem ou outro propósito que ambicione. A meta dos 20% permite cumprir uma das regras mais recomendadas, ou seja, destinar metade dos rendimentos às despesas essenciais, 30% às variáveis e o restante à poupança.

Mas só depois de analisar detalhadamente o seu orçamento é que deve fixar a parcela do salário que vai reservar todos os meses. Obtido esse valor, implemente uma regra que irá ajudá-lo. É conhecida por “pague-se a si mesmo” e passa por encarar a poupança como uma despesa. Poupe um determinado valor quando recebe o vencimento – e não aquilo que sobra no final do mês. Reforce esta ambição estabelecendo uma regra automática, de acordo com a qual, depois de receber o salário, transfere a percentagem que definiu para uma conta bancária onde junta as suas poupanças. Na sua conta do dia a dia fica o dinheiro necessário para as despesas fixas e variáveis. Para que o dinheiro que tem na conta poupança não seja “comido” pela inflação, coloque-o numa aplicação financeira, escolhendo o nível de risco que considerar mais apropriado.

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Dicas para poupar nas despesas fixas

Tratada a parte da “despesa que afinal é poupança”, é momento de “atacar” as outras componentes do seu orçamento para que possa aumentar a quantia que poupa todos os meses. Nas despesas fixas encontrará parcelas que pode cortar para colmatar o aumento do custo de vida.

No supermercado, onde se gasta uma parte considerável do orçamento familiar, as dicas são básicas mas eficazes. Procurar as promoções, reduzir a frequência das idas às compras e fazer uma lista para não comprar bens de que não necessita são algumas regras simples e que podem gerar resultados consideráveis.

Nas outras despesas associadas à casa (conhecidas por utilities) a margem para poupar também é elevada. Analise os contratos de telecomunicações (televisão, telefone e Internet), água, eletricidade, gás e outros. É provável que encontre margem para reduzir a fatura mensal através da renegociação de algum deles (ou de todos) ou que o consiga se mudar de fornecedor, pois as empresas habitualmente oferecem condições mais vantajosas a novos clientes. É mais favorável se subscrever um pacote de serviços. No caso das telecomunicações, avalie bem se necessita efetivamente de todos os serviços contratados – velocidade da Internet em casa, canais Premium ou tarifário do telemóvel (minutos, dados, etc.). Deve proceder do mesmo modo com os contratos dos serviços financeiros (crédito à habitação, seguros, etc.) que detém. Vai dar trabalho, mas, uma vez feito, gerará poupanças todos os meses, com a vantagem de não ter de prescindir de algo para atingir o objetivo de poupar.

De um modo geral, os transportes também representam uma parcela relevante do orçamento familiar. Há dicas específicas para poupar no combustível, mas a melhor de todas passa por, sempre que possível, evitar utilizar o automóvel. É uma opção amiga do ambiente e da carteira, sobretudo numa altura em que os combustíveis estão em máximos de vários anos, sem perspetivas de abrandar. Além de que as políticas fiscais tendem a agravar cada vez mais o preço cobrado aos consumidores finais pelas energias poluentes.

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Despesas variáveis: onde pode cortar?

Na componente variável do seu orçamento, comece por analisar onde está a gastar mais e incida aí o seu esforço para poupar. Se a fatura com as refeições fora de casa é elevada, reduza o número de vezes que almoça ou janta em restaurantes. Se comprar uma máquina de café, sentir-se-á menos incentivado a tomar o pequeno-almoço fora de casa.

Uma parte considerável das despesas variáveis resulta de aquisições por impulso com recurso a cartões de crédito, o que acaba por dar uma perceção errada sobre o dinheiro disponível. Compre a crédito o que é absolutamente necessário e verifique bem quais as condições dessa concessão.

Na compra de vestuário há uma dica que pode fazer a diferença na despesa: comece precisamente por analisar o seu guarda-roupa. Se precisa de renová-lo é provável que já não utilize várias peças, que pode vender para financiar a renovação. Há cada vez mais plataformas online através das quais a venda de produtos em segunda mão é fácil e intuitiva, não ocupando muito tempo. Esta dica serve para muitos outros objetos que tem em casa e já não utiliza – desde brinquedos a eletrodomésticos, passando por artigos de decoração, mobília, gadgets, entre outros. Resumindo: se precisa de comprar um bem duradouro novo, comece sempre por avaliar se pode financiar parte do gasto com a venda de um antigo.

A lista de dicas para poupar é interminável. Neste artigo deixamos algumas. No entanto, o mais importante é que saiba bem onde gasta o seu dinheiro (daí ser essencial começar pelo orçamento familiar), identificando onde será mais fácil e eficaz cortar para depois estabelecer objetivos realistas e adotar medidas com método e de simples execução para lá chegar. Apontar para soluções drásticas, de difícil concretização e com forte impacto na vida familiar pode ser o primeiro passo para falhar no seu plano de poupança, o que fará o seu custo de vida aumentar devido à inflação.

Poupar na carteira e defender o ambiente

A Goldenergy, entidade parceira da Associação Montepio e fornecedora do mercado português de energia 100% verde e gás natural, alerta que não é expectável a redução, no imediato, dos preços da eletricidade e oferece soluções aos consumidores, entre as quais o autoconsumo e a preferência por energia verde.

A inflação em Portugal está em máximos de nove anos e os economistas estimam que vai continuar a aumentar este ano. A Goldenergy sente esta pressão inflacionista nos custos?

Como é normal, a inflação tem reflexos no preço dos bens e produtos, pelo que a Goldenergy sente naturalmente o impacto deste aumento de custos nas aquisições que faz no âmbito da sua operação.

A Goldenergy está a conseguir transferir para os clientes o aumento dos custos?

Na sua política tarifária, a Goldenergy segue sempre o princípio de fornecer a eletricidade 100% verde com o preço mais justo do mercado. Tentamos não transferir para o consumidor demasiados custos que afetam a empresa, apenas os custos excessivos normais, decorrentes da aquisição da eletricidade no mercado grossista. E mesmo assim tentando sempre minimizar este impacto na fatura final dos nossos clientes.

Estando presente num setor no qual os preços da energia subiram fortemente, antecipam uma melhoria em 2022 ou é expectável um novo agravamento este ano?

O ideal seria que os preços da energia no mercado grossista baixassem, mas essa perspetiva não deverá concretizar-se no imediato, sobretudo tendo em conta a atual situação geoestratégica internacional, que tem implicações, por exemplo, nos preços do gás natural, um dos principais condicionantes para o preço da produção de eletricidade.

Que dicas de poupança sugerem para os consumidores lidarem com o aumento da inflação?

Uma das principais alternativas para contribuir para a poupança das famílias em termos de gastos com energia é o consumo de eletricidade 100% verde, poupando-se assim na carteira e defendendo-se o ambiente. Por outro lado, incentivamos a adoção do autoconsumo, levando os portugueses a considerarem investir em painéis solares, que permitem poupar nas faturas de eletricidade e, além disso, produzir a própria energia e comercializar e vender a que não é consumida.

Mas há outras formas de consumo de energia que geram poupanças. Isto porque, quando falamos de “energia”, não nos referimos apenas à energia elétrica, mas às diversas formas de energia como a térmica, a química ou cinética. Depois há as habituais dicas que todos os consumidores devem seguir, como desligar aparelhos elétricos quando não estão em funcionamento, trocar lâmpadas tradicionais por opções de baixo consumo, conhecer a eficiência técnica dos aparelhos elétricos, ter um bom isolamento dos espaços da casa, entre outras.

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